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Volney Berkenbrock
Religiões Afro-brasileiras - Cap. 4 PDF Imprimir E-mail
Escrito por Volney Berkenbrok   
Seg, 29 de Abril de 2019 09:40

 

Capítulo 4

O sistema religioso da Umbanda

 

 

1. Origem/Mito de criação/fundação/anunciação/surgimento/nascimento da umbanda:

Este mito já foi narrado/mencionado inúmeras vezes nos mais diversos contextos: livros de umbandistas, estudiosos da religião, revistas umbandistas, sites diversos e apostilas formuladas por terreiros e federações. Em quase todos os casos, este mito é citado também como marco histórico. De acordo com o mito, a anunciação da umbanda, que a faz surgir em um momento visível, representativo, teria ocorrido em dois momentos:

Conforme conta Rohde[1], no dia 15 de novembro de 1908 houve a primeira manifestação do caboclo das Sete Encruzilhadas em uma mesa espírita em um centro kardecista no qual Zélio Fernandino de Morais, então com 17 anos, foi levado devido a um problema de saúde que os médicos não conseguiram identificar e nem curar. Alguns falam sobre uma paralisia, outros sobre um caso grave de epilepsia. Não há um consenso se Zélio chegou curado ou não à reunião espírita ou se sua cura ocorreu durante os acontecimentos daquela noite. 

Nesta reunião começaram a se manifestar diversos espíritos de negros escravos e indígenas que eram convidados a se retirar pelo dirigente da mesa, que os julgava espíritos atrasados cultural, espiritual e moralmente. Foi então que baixou pela primeira vez o espírito do Caboclo das Sete Encruzilhadas, que fez um discurso em defesa das entidades que estavam ali presentes dizendo que estas estavam sendo discriminadas pela diferença de cor e classe social.

Os dirigentes da mesa tentaram afastar o próprio caboclo das Sete Encruzilhadas que avisou que, se não havia espaço ali para manifestação de espíritos de negros e índios por serem considerados atrasados, ele então fundaria, na noite seguinte, na casa de Zélio, um novo culto onde tais entidades poderiam exercer seu trabalho espiritual e passar suas mensagens.

No dia seguinte, 16 de novembro de 1908, às 20 horas, em meio a uma pequena multidão de amigos, parentes, curiosos e kardecistas incrédulos que se aglomeravam na casa de Zélio, baixou novamente o espírito do Caboclo das Sete Encruzilhadas que declarou que iniciava, a partir de então, uma nova religião na qual os pretos velhos e caboclos poderiam trabalhar. Determinou também que:

- a prática da caridade seria a característica principal do culto;

- o culto teria como base o Evangelho cristão e Jesus como mestre maior;

- o uniforme utilizado pelos médiuns deveria ser branco;

- todos os atendimentos seriam gratuitos;

- a religião se chamaria umbanda.

Além disso, fundou naquele dia a primeira tenda da umbanda da história: Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

Dez anos depois, em 1918, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, que continuava trabalhando com o médium Zélio de Moraes, determinou a fundação de sete novos templos que seriam responsáveis pela difusão ampla da nova religião, todos com o prefixo de Tenda: Tenda espírita São Pedro, Nossa Senhora da Guia, Nossa Senhora da Conceição, São Jerônimo, São Jorge, Santa Bárbara e Oxalá.[2]

Alguns estudiosos acreditam que a fundação da primeira Tenda espírita tenha acontecido em meados da década de 1920; outros dizem que isto aconteceu em meados de 1930. Mas esta narrativa constitui, de maneira geral, o chamado mito de origem ou fundação da umbanda, termo usado por vários pesquisadores para denominar um momento importante na organização da umbanda enquanto religião nova.

Misto de lenda e de realidade, a anunciação da Umbanda sofre algumas variações de narrador para narrador, mas a estrutura básica se mantém inalterada. Uma outra versão diz que Zélio de Moraes, aos 17 anos, começou  apresentar alguns distúrbios que a família acreditou que fossem de ordem mental e encaminhou o rapaz para um hospital psiquiátrico. Dias depois, não encontrando os seus sintomas em nenhuma literatura médica, foi sugerida à família que o encaminhasse a um padre para um ritual de exorcismo. O padre, por sua vez, não conseguiu nenhum resultado. Tempos depois Zélio foi levado a uma benzedeira conhecida na região onde morava que lhe diagnosticou o dom da mediunidade e lhe recomendou que trabalhasse para a caridade.

Por sugestão de um amigo de seu pai, Zélio foi levado à Federação Espírita de Niterói, no dia 15 de novembro de 1908. Ao chegar à Federação foi convidado pelo dirigente daquela instituição a participar da sessão. Logo em seguida, contrariando as normas do culto, Zélio levantou-se dizendo que ali faltava uma flor. Foi até um jardim apanhou uma rosa branca e colocou-a no centro da mesa. A atitude do rapaz provocou uma estranha confusão no local: ele incorporou um espírito e simultaneamente diversos médiuns apresentaram incorporações de caboclos e pretos-velhos. Advertido pelo dirigente do trabalho, a entidade incorporada no rapaz perguntou por qual razão era proibida a presença daqueles espíritos. Outro médium, que tinha o dom da vidência, quis saber da entidade o porquê dela falar daquele modo, pois via que era um padre jesuíta e lhe perguntou o nome. A resposta foi:

 

(...) se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho, para dar início a um culto em que estes pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou.

Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome que seja Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim.[3]

 

            Ainda de acordo com Giumbelli[4], citando Oliveira, no dia seguinte, perante a família e um grande grupo de desconhecidos, às 20 horas manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas.

 

Declarou que se iniciava naquele momento um novo culto em que os espíritos de velhos africanos, que haviam servido como escravos e que, desencarnados não encontravam campo de ação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas quase exclusivamente para trabalhos de feitiçaria, e os índios nativos de nossa terra poderiam trabalhar em benefício dos seus irmãos encarnados, qualquer que fosse o credo e a condição social. A prática da caridade, o sentido do amor fraterno, seria a característica principal desse culto, que teria por base o Evangelho de Cristo e como mestre supremo Jesus.

O caboclo estabeleceu as normas em que se processaria o culto: sessões diárias das 20 às 22 horas, os participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito. Deu, também, o nome desse movimento religioso que se iniciava. Disse primeiro allabanda (ou um dos presentes assim anotou), mas pensando bem que não soava bem a sua vibratória, substituiu-o por aumbanda, palavra de origem sânscrita que se pode traduzir por “Deus ao nosso lado” ou “o lado de Deus”.[5]

      

Estas datas, consideradas o momento do nascimento da umbanda como uma religião, foram o motivo de comemoração em seu centenário no 1º Congresso Brasileiro de Umbanda do Século XXI, realizado em São Paulo, entre os dias 14 e 16 de novembro de 2008.

 

2. As influências/confluências religiosas na formação da umbanda

Com o fim da escravidão, a população negra parece ter se desinteressado de suas origens africanas, na necessidade de se integrar na sociedade brasileira. No final do século XIX, o Brasil já era um país de brancos e negros, não se sabe bem de onde vindos, que seriam apenas brasileiros, como os chamados mulatos que representam esta mistura.[6] Compreende Prandi que, nesta época, a cultura africana já estava se diluindo na formação da cultura nacional em várias áreas e a sobrevivência da cultura negra passou a depender da sua capacidade de ser absorvida pela cultura branca. Em outras palavras, a preservação daquilo que é africano requeria apagar ou disfarçar exatamente a origem e a marca negra, em um processo de branqueamento que atingiu todas as áreas.

 Até mesmo a grande migração do final do século XIX e início do século XX teve também como finalidade atrair europeus brancos para o clareamento da sociedade brasileira, considerada muito escura para os padrões governistas da época.

Neste período de tempo, final de século XIX e início do século XX, várias mudanças importantes passaram a ocorrer no Brasil: a abolição da escravatura, a proclamação da República e o início de um processo de relativa integração de negros a uma sociedade urbana e de classes sociais em surgimento. A primeira eleição direta para presidente da república aconteceu em 1894, que elegeu Prudente de Morais, com votos de 2% da população considerada apta a votar (todos brancos, todos homens). Todas estas transformações propiciaram, entre as camadas mais pobres da população, e depois alcançando a classe média, um contato entre os rituais dos cultos sincréticos reunidos sobre o termo macumba com o espiritismo kardecista, que chegou ao Brasil no final do século XIX e início do século XX.

De acordo com o que dizem vários pesquisadores, entre eles Diana Brown[7], um grupo de indivíduos brancos pertencentes à classe média, mais intelectualizados, assume um papel fundamental na história umbandista. Descontentes com o espiritismo kardecista que considera inferiores moral e culturalmente os espíritos dos pretos velhos e índios que baixavam nas mesas desde o século XIX e que eram tratados como entidades carentes de luz, que deveriam ser doutrinadas e dispensadas, este grupo tratará de organizar aquilo que é compreendido como uma nova religião, a umbanda. Trata-se, neste caso, de umbanda branca e não o todo umbandista, que seria então o resultado da reorganização de alguns elementos:

- dos cultos de origem negra, como as macumbas, predominantemente banto e os candomblés nagô e angola;

- resquícios de práticas indígenas;

- valores morais católicos;

Tudo isto vinha emoldurado pela doutrina kardecista, que tem inspiração também em ideias hinduístas como os ciclos de reencarnação e a lei do karma (ou da causa e efeito) além do caráter cientificista herdado do contexto europeu do século XIX quando foi sistematizada ou codificada por Allan Kardec.

Para que se compreenda o momento de anunciação da umbanda e sua importância para seu reconhecimento como uma religião, é necessário conhecer a base sobre a qual surgiu o kardecismo. Conforme dito por Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti,[8] o kardecismo foi criado na França, na segunda metade do século XIX, por Hippolyte Leon Denizard Rivail, que usava o pseudônimo de Allan Kardec. Nesta época ele acabava de elaborar, a partir de um diálogo com espíritos superiores, a codificação, que é um conjunto de cinco obras que estabelecem as bases da doutrina espírita. O primeiro livro é o Livro dos Espíritos. Em seguida ele escreveu o Livro dos Médiuns; o Evangelho segundo o espiritismo; o Céu e o Inferno e por último A Gênese, os Milagres e as Predições. A codificação foi publicada por Kardec entre 1857 e 1868.

Mesmo não sendo reconhecida como ciência, seus adeptos consideram o kardecismo uma doutrina de cunho científico-filosófico-religioso voltada para o aperfeiçoamento moral do homem e acreditam na existência de um Deus único, na possibilidade de comunicação útil com os espíritos através de médiuns e na reencarnação como processo de crescimento espiritual e justiça divina.

A verdade contida nestes livros, segundo Allan Kardec, teria sido revelada pelos espíritos por meio de um procedimento que ele qualifica de científico, racional e experimental. Por isto os kardecistas não gostam de dizer que o kardecismo é uma religião, preferindo chamá-lo de doutrina, ciência, filosofia, uma vez que trabalham também com ideias da tradição filosófica ocidental, como Descartes, Platão e Aristóteles. Segundo os kardecistas, eles se alinham ao lado da razão, em oposição ao sobrenatural e ao mágico. A codificação se insere na linha de filiação cristã que compreende ser Jesus Cristo um espírito superior que encarnou para auxiliar a evolução humana. O Brasil tem o maior número de adeptos do kardecismo do mundo.

Assim, o kardecismo também tem seu próprio mito de criação que diz que, durante o século XIX, houve uma grande onda de manifestações mediúnicas nos Estados Unidos e na Europa. Estas manifestações consistiam principalmente de ruídos estranhos, pancadas em móveis e objetos que se moviam ou flutuavam sem nenhuma causa aparente. Em 1855, o professor Denizard Rivail, que só depois adotou o pseudônimo de Allan Kardec, pretendia investigar o fenômeno que muitas pessoas afirmavam ter experimentado na época, das mesas girantes, em que mesas e objetos em geral pareciam animar-se com uma estranha vitalidade. Apesar de inicialmente duvidar dos fenômenos relatados, após dois anos de pesquisas, Kardec não tinha constatado um motivo para dizer que todos os acontecimentos dessa ordem seriam falácias e/ou charlatanices. Pessoalmente convencido não só da realidade do fenômeno, mas também acreditando que eles eram realmente causados por influência de espíritos, Rivail passou a promover novos métodos de estudo para a identificação deste e outros fenômenos do tipo. Assim, o kardecismo também tem sua própria data de nascimento: 18 de abril de 1857, quando foi publicado o Livro dos Espíritos.

Várias características constantes desta codificação foram transplantas para a umbanda, que passou a ser denominada de umbanda branca em contraposição a outras formas de práticas que passaram a ser chamadas de magia negra. Entre os vários princípios sobre os quais se baseia o kardecismo, os seguintes pontos constam dos fundamentos da nova religião então denominada umbanda:

- Existência e unicidade de Deus;

- Existência e imortalidade do espírito;

- Conceito de criação igualitária de todos os espíritos, simples e ignorantes em sua origem, e destinados invariavelmente à perfeição, com aptidões idênticas para o bem ou para o mal, dado o livre-arbítrio;

- Possibilidade de comunicação entre os espíritos encarnados (vivos) e os espíritos desencarnados (mortos), por meio da mediunidade. Essa comunicação é realizada com o auxílio de pessoas com determinadas capacidades, chamadas médiuns;

- Jesus, criado por Deus, é o guia e modelo para toda a humanidade. Segundo o espiritismo, a moral cristã contida nos evangelhos canônicos é o maior roteiro ético-moral de que o homem possui, e a sua prática é a solução para todos os problemas humanos e o objetivo a ser atingido pela humanidade.

- Fora da caridade não há salvação. Para o espiritismo a caridade consiste em benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros e perdão das ofensas.

- Abnegação na prática do bem, ou seja, não se deve cobrar pela prática da caridade, nem o fazer visando a segundas intenções. Toda a prática espírita é gratuita, como orienta o princípio moral do evangelho: “Dai de graça o que de graça recebestes”;

Então, nesta nova religião, a umbanda branca, os espíritos de negros e de índios não seriam mais menosprezados a priori, como no kardecismo, e sim cultuados e valorizados pelas suas mensagens e pelo trabalho espiritual de caridade que empreendiam realizando curas, abertura de caminhos, desobsessão, etc.

O que se observa é que as práticas rituais aplicadas neste contexto, mesmo tendo influência direta dos cultos negros e indígenas, haviam sido transformadas em relação a suas antecessoras, prevalecendo a postura kardecista, inclusive no nome dos templos que foram chamados Tenda Espírita de Umbanda, no modo de organização do culto, mais silencioso, ordenado, simplificado, muitas vezes seguindo o padrão das mesas kardecistas.

Mas aconteceu que esta nova religião, que buscava ordenar a umbanda sob o viés mais próximo do kardecismo, mais branco, passou a repetir o discurso marcado por uma lógica identitária (que de maneira silenciosa reproduzia e negava os jogos hierárquicos de raça e cor da sociedade brasileira) que diferenciava a assim chamada umbanda branca ou pura do resto das práticas consideradas por ela como bárbaras, fetichistas, primitivas das macumbas, candomblés e outros cultos genericamente chamados de magia negra. A umbanda verdadeira e pura seria a branca, que aceita o mestiço, em oposição a todos os outros cultos de magia negra, como a quimbanda, o candomblé (sistema religioso completamente diferente da umbanda), catimbó (jurema), batuque, xangô, etc.

Este era e continua sendo um tipo de umbanda. Mas para que esta religião passasse a existir socialmente, sendo percebida como distinta num contexto maior, era preciso demarcar suas fronteiras, atribuir suas características diferenciais. O mito da criação/anunciação da umbanda tem uma grande importância porque marcou o reconhecimento da umbanda como uma religião autônoma, mesmo tendo nascida em um movimento de base kardecista. 

Diana Brown[9] diz que a participação da classe média foi fundamental na formação da umbanda. Esta pesquisadora, que estudou durante vários anos a umbanda no Rio de Janeiro, diz que, durante meados dos anos 1920, um grupo de homens da classe média dedicou-se à criação de um sincretismo de práticas religiosas afro-brasileiras e do Espiritismo, adotando o termo umbanda como o nome desta nova religião. Segundo ela, estes homens eram espíritas insatisfeitos e entediados com o que consideravam ser uma ênfase superintelectualizada do kardecismo. Passaram, assim, a estudar os terreiros afro-brasileiros que funcionavam nas periferias. De acordo com o que parece outra variação do mito da criação da umbanda, durante este período, um dos membros do grupo adoeceu e, enquanto doente, recebeu o espírito de um índio brasileiro que revelou sua missão: a fundação de uma religião chamada umbanda. O primeiro destes centros foi aberto em Niterói, em 1927, sendo posteriormente transferido para o Rio de Janeiro. Esta antropóloga diz que houve um esforço coletivo liderado por Zélio de Moraes para promover a umbanda branca, modernizando as crenças afro-brasileiras e desenvolvendo práticas mais aceitáveis à classe média branca. A umbanda branca deixou de fora o sacrifício dos animais. O nome do primeiro terreiro faz referência ao catolicismo: Nossa Senhora da Piedade.

O primeiro estágio da expansão da Umbanda coincidiu com distúrbios políticos e sociais. A ditadura nacionalista de Getúlio Vargas (1930-1945) empregou a umbanda para popularizar e consolidar seu poder. Os espíritos da umbanda (caboclos e pretos-velhos) se integraram perfeitamente ao nacionalismo brasileiro do regime de Vargas. Tais símbolos da umbanda ajudaram seus esforços para criar uma cultura nacional que tocou a população multi-étnica brasileira.

Mesmo que a institucionalização e a nacionalização da umbanda tenham se dado sobretudo na primeira metade do século XX pela ação dos tais grupos de classe média oriundos do kardecismo, as características rituais, os elementos materiais e simbólicos, as memórias e o imaginário do universo umbandista não podem ter sua constituição reduzida a esse período, mas antes o contrário: a maioria destes elementos já vinha se moldando há muito tempo. A institucionalização da umbanda, a partir da criação de federações, foi um reflexo do processo de mudança pela qual passava a sociedade brasileira. Dizem diversos pesquisadores, entre eles Oliveira, que a preocupação em edificar uma religião centrada na possibilidade de manifestação de espíritos oriundos das três etnias que formam a nação brasileira, foi certamente influenciada pelo intenso nacionalismo do regime de Vargas e pelo esforço de criar uma cultura nacional como base para a unificação do povo brasileiro.[10]  

 

Mas a ideia de que a umbanda teria nascido naquele movimento de base kardecista no início do século XX deixa de levar em consideração o processo de constituição longo e complexo de um universo religioso que se insere no ainda mais amplo universo cultural afro-brasileiro. Afinal, diversas variações de cultos da época e também de hoje, e que são compreendidos atualmente como pertencentes ao complexo umbandista, mantém semelhanças ritualísticas e culturais profundas em relação aos exemplos de formas de religiosidade sincrética presentes no Brasil desde o século XVII.[11]

 

As características rituais, os elementos materiais e simbólicos, as memórias e o imaginário do universo umbandista não surgiram de repente na primeira metade do século XX, conforme diz Rodhe. A maioria destes elementos já estava sendo moldada há muito tempo. Não foi a partir da data/marco do nascimento da umbanda que as entidades pertencentes às três categorias: caboclos (indígenas) pretos-velhos (negros) e as crianças (brancas, mas não todas) passaram a baixar nos terreiros de umbanda. Existem registros bem mais antigos sobre práticas umbandistas no Brasil que se conhece e que se referem a uma mulher chamada Luzia Pinta. Esta mulher era angolana, veio para o Brasil ainda criança, como escrava e já batizada. Viveu na Bahia até os 20 anos, mudando-se depois para Minas Gerais. Aos 30 anos ela comprou sua alforria e se estabeleceu em Vila de Sabará, onde organizou um terreiro de um calundu/angola, que funcionou entre os anos de 1720 e 1740-41. O período de funcionamento do terreiro (20 anos) mostra que ele deveria ter sido bastante estruturado.

Segundo este autor, há uma documentação bastante extensa sobre Luzia Pinta porque ela foi presa, interrogada e torturada pela inquisição em Lisboa, para onde foi levada em 1741-1742. Há muitos depoimentos de testemunhas em seu processo que mostram o funcionamento do seu culto e sobre as entidades que atuavam com Luzia. As cerimônias organizadas por ela eram abertas ao público e frequentadas por negros e brancos. Também eram acompanhadas de cantos e toques de atabaques. Objetivos das reuniões: purificação da comunidade; cura de doenças ou malefícios; realização de adivinhações esclarecedoras.

A música e a dança começavam até que Luzia entrava em transe, quando era paramentada com as roupas da entidade incorporada. Ela trabalhava com diferentes entidades e as missas faziam parte de seus ritos de cura. Estas missas eram dedicadas a Santo Antônio e São Gonçalo e em algumas ocasiões ela também aparecia vestida como um anjo. Dois aspectos se destacam no calundu de Luzia Pinta: a influência do cristianismo e a capacidade de incorporar diferentes categorias de entidades, que são marcantes na umbanda como a entendemos hoje, sem falar da música percussiva, da dança ritual e dos objetivos das sessões.

É comum entre os médiuns da umbanda o trabalho com diferentes entidades: um caboclo e um preto-velho; um caboclo e um exu; um preto-velho e um exu, assim como acontecia no calundu de Luzia Pinta. Toda esta documentação sobre Luzia Pinta mostra que, em 1720, há 300 anos atrás, já existia no Brasil um culto sincrético de elementos africanos, portugueses e indígenas voltado ao atendimento de um público indiscriminado no qual eram realizadas curas, limpezas espirituais e adivinhações acompanhadas por música percussiva e danças e com a presença de entidades de diferentes categorias.

3.  Do processo de institucionalização/legitimação da umbanda

A emergente classe trabalhadora urbana definiu Getúlio Vargas como o pai dos pobres e como o pai da Umbanda. Até os anos 60, muitos terreiros de Umbanda mostravam a foto de Getúlio Vargas como um tipo de santo padroeiro. Mas apesar da identificação com a ditadura de Getúlio Vargas, outros elementos pertencentes à classe proeminente perseguiam a umbanda e seus seguidores. Este foi um período em que os encontros religiosos eram interrompidos pela polícia, líderes espirituais, médiuns e membros dos terreiros eram perseguidos e os ícones da umbanda eram destruídos ou recolhidos. Vestimentas, amuletos sagrados, instrumentos e outros objetos das religiões afro-brasileiras que foram confiscados pela polícia podem ainda ser encontrados no Museu da Polícia no Rio de Janeiro. Até recentemente, esta coleção era ridicularizada como uma coleção de Bruxaria Negra.[12]

O restabelecimento da democracia em 1945 assinalou o início da liberdade religiosa. Várias federações de umbanda foram fundadas em São Paulo em 1953. As leis, entretanto, não equivaliam a aceitação universal. Os cultos de umbanda ainda eram considerados suspeitos. A polícia local registrou todos os terreiros. A partir de 1964  a lei que exigia vários registros dos terreiros de umbanda foi eliminada e só um registro civil era necessário para estabelecer um terreiro. O período entre ditaturas – 1945 a 1964 – permitiu a expansão da umbanda. Os políticos, a polícia, e os líderes civis frequentavam os terreiros, especialmente durante os anos de eleição.

Uma pesquisa conduzida pelos antropólogos Lísias Nogueira Negrão e Maria Helena Concone[13] mostram que, na década de 1940, 58 organizações religiosas foram registradas como terreiros de umbanda em São Paulo enquanto 803 se declaravam Centros Espíritas. Por volta dos anos 1950, as posições se reverteram: 1.025 organizações se declararam Terreiros de Umbanda, 845 Centros Espíritas e somente um Terreiro de Candomblé. Durante os anos 1970, havia 7.627 Terreiros de Umbanda, 856 Terreiros de Candomblé e 202 Centros Espíritas. O Brasil passou de 50.000 Terreiros nos anos 60 para 300.000 no início dos anos 1980. A ditadura militar terminou em meados dos anos 1980. O Brasil se tornou uma nação democrática, cada vez mais orgulhosa da sua diversidade cultural. Entre os anos 1950 e 1970, a repressão da polícia diminuiu e os membros da umbanda aumentaram.

Conforme dito acima, na época de Vargas foi empreendida uma articulação política e identitária-discursiva para legitimar socialmente a umbanda. Um dos desafios principais dos intelectuais envolvidos era afastar física e simbolicamente da religião umbandista todas as práticas que se assemelhassem aos rituais bárbaros e primitivos da magia negra, assim denominada quimbanda, significando o oposto da umbanda, a magia branca e pura. Foi assim estabelecida uma oposição simbólica derivada da dicotomia cristã Bem e Mal entre as duas modalidades de culto. De um lado, os caboclos, pretos-velhos e crianças (entidades da luz) e a outra com exus e pombas-gira (entidades das trevas).[14]

Esta oposição entre umbanda e quimbanda foi motivo de inúmeras controvérsias ao longo do século XX entre os umbandistas, que aos poucos passaram a ser compreendidos como a totalidade do grupo e não apenas aos praticantes da umbanda branca. As casas e indivíduos mais próximos ao kardecismo, mais ocidentalizados, renegavam a presença dos exus em seus cultos. Outros grupos afirmam que esta presença é indispensável para um bom funcionamento do trabalho e para a defesa das casas e médiuns. Já os quimbandeiros trabalhavam e trabalham somente com os exus.

Hoje em dia, os exus e pombas-gira estão plenamente incluídos no universo umbandista, constituindo o que é chamado linha de esquerda ou povo da rua. A quimbanda agora é uma parte do universo constitutivo de um universo maior denominado umbanda, embora algumas casas digam não trabalhar com exus, assim como a macumba, o catimbó, a jurema, a ayahuasca, etc.[15]

Assim, diz Rohde[16], o peso atribuído por diversos pesquisadores, como Birman, Brown, Concone e Negrão, Giumbelli, Oliveira, Ortiz e Seiblitz à relação entre o grupo responsável pela institucionalização da religião (o processo institucional da umbanda foi proposital, não aconteceu por acaso) com o projeto político-cultural nacionalista de Vargas através da fundação de federações umbandistas deve ser tratado de forma mais cuidadosa. Isso porque, mesmo que tal relação tenha trazido modificações profundas nos modos de fazer religioso de determinados grupos umbandistas, outros segmentos do culto como hoje o entendemos continuavam a exercer suas práticas e crenças paralelamente ao grupo mais intelectualizado, sem qualquer preocupação com a legitimidade da umbanda no campo religioso brasileiro. Exemplos disso são a própria quimbanda, as diversas macumbas que provavelmente não se integraram ao movimento de institucionalização-nacionalização e os outros cultos que se mesclaram ao longo do tempo com o universo umbandista, tendo hoje suas fronteiras regidas mais por opções pessoais do que por dinâmicas amplas de grupo. Como exemplos, podemos citar:

 

- Quimbanda: trabalha exclusivamente com entidades chamadas povo da rua ou entidades da esquerda: exus, pombas-gira.

 

- Jurema ou catimbó: é também um culto de possessão, de origem indígena. Tem um caráter mágico-curativo, baseado no culto dos mestres, entidades sobrenaturais que se manifestam como espíritos de antigos e prestigiados chefes de cultos. Tem por base um sistema mitológico no qual a jurema é considerada árvore sagrada e em torno dela dispõe-se o reino dos encantados, formado por cidades habitadas pelos mestres cuja função, quando incorporados, é curar doenças, receitar remédios e exorcizar as coisas feitas e os maus espíritos dos corpos das pessoas. O culto da jurema caracteriza-se pela ingestão de uma bebida sagrada, feita com a casca da árvore, que tem como finalidade propiciar visões e sonhos e também pelo uso intensivo do fumo, utilizado na defumação com a fumaça dos cachimbos. Para os juremeiros, seus ritos representam a sobrevivência dos ritos indígenas e caboclos.

 

- Diversas macumbas que não se integraram ao movimento de institucionalização/nacionalização.

 

- Outros cultos que se mesclaram ao universo umbandista ao longo do tempo, como a jurema, o catimbó, o vegetalismo, a wicca e outros.

O que caracteriza todas estas práticas e variações de cultos pertencentes ao universo maior denominado umbanda, diz Rohde, é a influência da religião do branco, trazida pelo colonizador, das religiões africanas e das crenças indígenas.

4. Algumas características da umbanda

A umbanda, conforme diz Giumbelli, possui fronteiras minimamente definidas e rituais minimamente codificados.[17] O local onde são realizadas as sessões, é comandado por um pai-de-santo ou uma mãe-de-santo, que são os líderes dos grupos religiosos que se reúnem em um terreiro, centro ou casa santa. Os elementos citados em seguida foram retirados de diversos sites de terreiros de umbanda e representam um consenso entre suas práticas.

Os espíritos da umbanda se organizam em uma espécie de linhas e falanges. A hierarquia é conduzida pelos santos ou orixás. No processo de sincretismo que caracteriza a umbanda, santos católicos e orixás se correspondem:

São Jorge : Ogum

São Sebastião: Oxóssi

São Jerônimo: Xangô

Santa Bárbara: Yansã

Nossa Senhora da Imaculada Conceição: Oxum

Jesus Cristo: Oxalá

Nossa Senhora da Glória: Iemanjá (ou N. S. dos Navegantes)

São Cosme e Damião: Ibeji

Cada um desses santos tem sob seu controle um número de espíritos menores de vários tipos.

Sacramentos

A umbanda possui 3 sacramentos que são católicos: batismo, casamento e funeral. Para o casamento, não se exige que o casal seja adepto da umbanda.

Iniciação na umbanda:

Esse início acontece de forma parecida para a maioria das pessoas. Geralmente o médium vai a uma sessão de umbanda e recebe a informação de que é médium e precisa colocar roupa, termo que significa passar a frequentar as sessões de Umbanda usando a tradicional roupa branca. Como a entidade nos escolhe? Esta escolha é feita anteriormente ao nascimento. Quando nascemos, já temos uma coroa formada (grupo de entidades com que se trabalha). Este grupo, ou esta coroa, já é predestinada à pessoa, escolhida por ela mesma, pelo seu próprio espírito quando estava no plano espiritual. O próprio espírito escolhe as entidades. Quando a pessoa entra na gira (fica rodando) e não sabe ainda qual a sua entidade, ela já está ali, já sabe quem é você, embora você não saiba. Mas foi seu próprio espírito que escolheu a entidade. Esta foi uma escolha feita pelas duas partes, pois a entidade também escolheu a pessoa. Existe uma harmonia entre as duas partes. A entidade tem que aceitar trabalhar com o médium, que tem que concordar. Este acordo, feito entre as duas partes, exige semelhanças de temperamento. Existem também entidades que acompanham a pessoa para proteção, mas que não trabalham com ela. E existem aquelas que trabalham com o médium, mas não incorporam.

No início, o médium passa por um desenvolvimento em que os guias muitas vezes não vêm, apenas deixam o médium tonto ou o fazem balançar. Em outros momentos incorporam mas não falam e nem dão consultas. Pouco a pouco os guias passarão a vir de forma diferente e também irão falar e conversar com as pessoas citando o seu nome e as suas preferências. Mas não acontece sempre assim. Muitas pessoas, quando iniciam, ficam confusas, pois pode ser que os guias deixem o médium semiconsciente, ou até consciente, mas isso não significa que ele não esteja incorporado. O processo de auto-iniciação demanda tempo e esforço pessoal por parte do iniciante, pois a experiência e a maturidade mediúnica só se adquirem com a prática, com a persistência e com a boa vontade do adepto de servir, de aprender e de se desenvolver mediunicamente, até conseguir trabalhar em harmonia com a entidade.

Batismo de iniciando

No batismo de iniciados, geralmente feito nas cachoeiras ou praias, estes são consagrados ao seu Orixá Pessoal ou regente. Este batismo é geralmente chamado de lavagem de cabeça. Na Umbanda, ao aceitar o batismo, o indivíduo está dizendo para si mesmo e para os outros: "conheço a Umbanda e seus princípios e concordo com todos, estou disposto a participar do trabalho empreendido pelos mensageiros da Corrente Astral de Umbanda, na construção de um mundo melhor". Esse é o sentido. A partir daí, as entidades passam a contar com aquele indivíduo de modo mais completo e efetivo, face à evidente opção que ele fez de servir.

Ritual de coroação:

A coroação ocorre quando o médium alcançou um nível aceitável em seu desenvolvimento, um novo estágio em sua evolução mediúnica, pois a entidade já possui total domínio sobre seus pontos de força, importantíssimos para um bom trabalho espiritual (não confundir com o médium ser ou não consciente). Assim, o que o ritual representa é que depois de coroado o médium passa a ter maior responsabilidade, pois está apto a servir de instrumento em consultas com suas entidades. Poderá também participar de trabalhos mais pesados: (desmanches, desobsessões, demandas, entre outros), e ajudar no desenvolvimento de médiuns mais novos na casa. No dia da coroação, a entidade mentora daquele médium tem de incorporar e confirmar seu nome (normalmente ela já o fez antes da coroação). Depois revela a falange em que trabalha, risca seu ponto e traduz sua representação, e, se possível, poderá passar também seu ponto cantado. Tudo acontece, diante do mentor da casa, que confirma (ou não) o que foi declarado. Além disso, quando se torna possível, recorre-se ao auxílio de um médium clarividente (com a chamada vidência superior), para firmar seu dom e ver a luz do ponto riscado, informando se o mesmo está correto.
Depois disso, sob um cântico apropriado para a ocasião, o mentor da casa, num ato simbólico, coloca uma coroa preparada com vegetais na cabeça do médium incorporado e todos os presentes saúdam a entidade.
Assim, o médium coroado torna-se apto a participar de determinados trabalhos, que exigem um maior conhecimento e principalmente, um melhor entrelaçamento com suas entidades espirituais, além do total domínio de sua mediunidade, coisa que um médium em desenvolvimento ainda não tem.

Defumador

Outra característica da umbamda é o uso do defumador durante os trabalhos. Na umbanda, o defumador tem a função de equilibrar o ambiente de trabalho, de acordo com a necessidade, pois tem a propriedade de modificar o ambiente através da queima de ervas e resinas.O defumador pode ser de três tipos: Mantenedor do equilíbrio, positivador do equilíbrio e negativador do equilíbrio.

Ponto Riscado: composto por uma série de elementos representados por desenhos. O ponto traz aos trabalhos a representação das vibrações, objetos e elementos necessários à sua feitura. O ponto tem a qualidade de identificar uma entidade pelo fato de que ela normalmente se utiliza daqueles elementos em seus trabalhos, mas estes pontos não necessitam ser iguais em todas as sessões.

Atraímos energias quando riscamos um ponto, cantamos os pontos, vibramos ou oramos com essa finalidade e, ao mesmo tempo, realizamos uma invocação.

O giz usado para grafar o ponto é chamado pemba. Pemba era um giz de fabricação especial, obtido através de um rito ou cerimônia. Passava de geração a geração e servia para grafar determinados sinais cabalísticos ou mágicos, chamados hoje de ponto riscado. De modo geral, os sinais riscados pela pemba eram para uso de magia.

Preceitos

A Umbanda também faz uso de alguns preceitos específicos e predeterminados. Na Umbanda os preceitos são abstenções voluntárias em benefício da positivação ou negativação de cada um e se dividem em três grupos distintos: primordial, opcional e ocasional. 

PRIMORDIAL: é o preceito indispensável a todos os médiuns, sem exceção, como preparativo para os trabalhos mediúnicos nas sessões de terreiro. Divide-se em sete itens:

  1. Isenção de sexo, pelo menos 8 horas antes do início dos trabalhos mediúnicos.
  2. Isenção de ingestão de produto animal que dependa do sacrifício do mesmo, inclusive peixes, isenção esta a partir de 24 horas antes do trabalho mediúnico.
  3. Isenção, nas 12 horas anteriores ao trabalho mediúnico, de maus pensamentos (ódio, orgulho, inveja, vaidade).
  4. Uso de roupa apropriada e predeterminada para o trabalho mediúnico.
  5. Banho de descarga, conforme determinado a cada um.
  6. Pontualidade ao início dos trabalhos.
  7. Entregar-se ao trabalho espiritual sem a preocupação com a hora do término do mesmo.

OPCIONAL: preceito determinado pelo orientador espiritual ou pelo chefe do terreiro, para determinados médiuns:

  1. Isenção de produtos animais, mesmo que não dependam do sacrifício dos mesmos. Exemplo: manteiga, queijo, ovos, leite, etc.
  2. Banhos de descarga especiais e específicos.
  3. Firmeza extraordinária do Anjo de Guarda.

OCASIONAL: é o preceito de emergência, o que é praticado em caso de emergência, quando necessário ao trabalho mediúnico, fora da corrente fraterna.

  1. Firmar os Anjos de Guarda, o seu e da pessoa a ser atendida.
  2. Exigir no local o mais absoluto silêncio e concentração.
  3. Pedir licença e salvar o Orixá TEMPO.
  4. Mentalizar o Divino Nazareno, invocando a Ele a permissão do trabalho sem os preceitos normais e rogando-lhe o auxílio do Astral Superior.

Independente de todos estes preceitos, todo médium deve abster-se durante o trabalho mediúnico de joias, bijuterias, objetos metálicos e dinheiro; o médium deve procurar estar o mais puro possível para ingressar na corrente fraterna.

Assentamento: é o local onde são colocados alguns elementos com poderes magísticos, com a finalidade de criar um ponto de proteção, defesa, descarga e irradiação. Um assentamento pode ser destinado a uma só força ou poder ou a várias. Mas, em geral, faz-se um para cada força ou poder que se deseja assentar. Uma força ou poder é assentado para que, a partir do local do assentamento, os poderes que vivem no plano divino da criação possam auxiliar os trabalhos espirituais que são realizados nos centro de umbanda. São pontos de descarga das forças negativas que existem no plano material, que serão absorvidas e enviadas de volta às faixas vibratórias negativas. Esta é uma das funções de um assentamento de força e poderes. A entidade assentada (Orixá ou Guia Espiritual) tem no assentamento elementos com poderes mágicos que utiliza, ativando-os segundo as necessidades do Centro, do trabalho espiritual e dos médiuns.

Porque as entidades fumam e bebem no terreiro:

1)      Existe um propósito conhecido apenas pela entidade para que isto aconteça

2)      Algumas entidades ainda estão apegadas aos bens da terra.

3)      A entidade fuma para defumar o médium de dentro para fora. As cargas negativas estão acumuladas nos pulmões e nos rins.

Diferenças entre oferenda, despacho e entrega:

Oferenda – A maioria das oferendas é feita com alimentos. Oferenda é uma oferta a seu Orixá ou à sua Entidade. Não precisa ser necessariamente comida, podendo ser roupas ou outros materiais. São depositados em encruzilhadas ou na mata. As entidades não vão pegar as oferendas e levá-las com elas, e sim absorver a energia contida nos objetos.

Despacho – É feito por médiuns que estão presentes no terreiro. São materiais que já não são mais usados, mas que ainda contém a energia do terreiro (restos de comida, bebida, uma bengala que quebrou, um terço que estragou, restos de trabalho que foi feito no terreiro) e necessitam ser jogados fora. Mesmo estragado, este material contém energia, pois era usado pela entidade, necessitando ser despachado, isto é, entregue à entidade para que ela mesma possa jogá-lo fora. Despacho é, pois, a entrega de materiais que não são mais utilizados pela entidade, sendo feito pelos médiuns que trabalham dentro da umbanda.

Entrega – Normalmente é feita a pedido de uma entidade. Por exemplo: é feito um trabalho dentro do terreiro para tirar um mal de uma pessoa. Neste trabalho são utilizados materiais que não podem ficar no terreiro. Não é um despacho, porque o material (vela preta, vermelha, farofa, um copo, cachaça, etc.) ainda vai ser usado pela entidade, só que em outro lugar, escolhido por ela. É uma entrega à entidade para que ela possa continuar o trabalho e terminá-lo. É aquilo que muitas vezes é chamado de macumba. O trabalho é iniciado no terreiro e vai ter continuidade em outro lugar.

Linhas e Falanges

            As entidades da umbanda estão inseridas em linhas e falanges. Cada linha compõe-se de sete grandes falanges, que por sua vez também tem um chefe e cada falange divide-se em sete sub-falanges e assim por diante, obedecendo a um critério lógico. Uma linha ou vibração, equivale a um grande exército de espíritos que rendem obediência a um Chefe. Este Chefe representa para nós um Orixá e cabe a ele uma grande missão no espaço. As Linhas da Umbanda são sete. Cada linha se divide em sete falanges. A cada grau que a hierarquia vai descendo, a quantidade de entidades vai se multiplicando por sete, pois cada entidade, dentro de sua hierarquia, delega ordenações para mais sete.

1. Linha De Oxalá
2. Linha De Iemanjá
3. Linha De Ogum
4. Linha De Oxóssi
5. Linha De Xangô
6. Linha De Oxum / Yori (energia dos anjos de Olorum)
7. Linha De Abaluaê (Omolu: comanda as doenças e a saúde) / Yorimá (senhores das experiências)

Diversas falanges se manifestam na umbanda, entre elas: pretos-velhos, caboclos, boiadeiros, baianos, crianças, oriente, marinheiros, ciganos, exus e pombas-gira.

 



PRETOS – VELHOS

 

            Uma das mais bonitas falanges da umbanda é denominada  Falange dos Pretos-Velhos ou Linha das Almas.  Os pretos-velhos têm como característica principal a prática da caridade. Os pretos-velhos viviam em cativeiro, amontoados em senzalas, alimentavam-se de mingau de farinha, inhame, toucinho, banana. Eram submetidos às condições desumanas e implacáveis de trabalho. Só os mais fortes sobreviviam. Por isso, um preto-velho, quando incorpora no médium, vem de forma envergada, sob o peso dos anos de existência em vida na terra, senta-se com a dificuldade das juntas enrijecidas e os músculos fatigados num pequeno banco de madeira, que lembra o antigo toco que existia nas senzalas. São espíritos de velhos africanos que foram trazidos para o Brasil como escravos e que trabalham na Umbanda como símbolos da fé e da humildade. Seus trabalhos são de ajuda àqueles que estão em dificuldade material ou emocional, sendo que o seu trabalho se desenvolve mais para o lado emocional e físico das pessoas que os procuram, sendo chamados carinhosamente de psicólogos dos aflitos.  Sua paciência em escutar os problemas e aflições dos consulentes faz deles as entidades mais procuradas, sendo chamados de Vovôs e Vovós da Umbanda.   Também usam ervas em seus trabalhos de magia e principalmente para rezar pessoas doentes e crianças que estão com mau olhado. Suas rezas são conhecidas como poderosas, fazem uso também de patuás, saquinhos em que são depositados elementos de magia e que os consulentes usam no corpo para proteção. Da mesma forma que os Caboclos, os Pretos Velhos usam cachimbos para limpeza espiritual, jogando sua fumaça sobre a pessoa que está recebendo o passe e limpando a aura de larvas astrais e energias negativas.

Alguns nomes de pretos-velhos que baixam prestando caridade: Pai Joaquim da Angola, Pai Joaquim do Congo, Pai João do Congo, Vovô Rei do Congo, Pai Jacó, Vovô João de Aruanda, Vovó Maria Conga, Vovó Cambinda, Vovó Luiza, Vovó Benedita, Vovó Maria Redonda, Vovô João de Aruanda, Pai Benedito, Tia Maria, Vovó Catarina D’Angola.

 

 

CABOCLOS

 

Caboclos são as almas de todos os índios antes e depois do descobrimento e da miscigenação. Constituem o braço forte da Umbanda, muito utilizados nas sessões de desenvolvimento mediúnico, curas através de ervas e simpatias, desobsessões (tratamento de pessoas que estejam sofrendo de prejudicial interferência por espíritos, encarnados ou desencarnados), solução de problemas psíquicos e materiais, demandas materiais e espirituais e uma série de outros serviços e atividades executados nas tendas. Na Umbanda, os Caboclos constituem uma falange e, como tal, penetram em todas as linhas, atuando em diversas vibrações. Entretanto, cada um deles tem uma vibração originária, que pode ser ou  não aquela em que ele atua.  Antigamente existia a concepção de que todo Caboclo seria um Oxóssi, ou seja, viria sob a vibração deste Orixá. Em outra percepção, Caboclos diferentes possuem vibrações originais diferentes, podendo se apresentar sob a vibração de Ogum, de Xangô, de Oxóssi ou Omulu. Já as Caboclas, podem se apresentar sob as vibrações de Iemanjá, de Oxum, de Iansã ou de Nanã. Não há necessidade da vibração do Caboclo-guia coincidir com a do Orixá dono da coroa do médium: o guia pode ser, por exemplo, de Ogum e atuar em um filho de Oxóssi; apenas neste caso, a entidade, embora sendo de Ogum, assimilará a vibração de Oxóssi. No panorama espiritual em torno da Terra predominam espíritos ociosos, atrasados, desordeiros, semelhantes aos nossos marginais encarnados. Estes ainda respeitam a força. Os índios, que são fortíssimos, mas de almas simples, generosas e serviçais, são utilizados pelos espíritos de luz. São também utilizados pelos guias, nos casos de desobsessão, pois, pegam o obsessor contumaz, impertinente e teimoso, amarrando-o em sua tremenda força magnética e levando-o para outra região. Os caboclos são espíritos de muita luz que assumem a forma de índios, prestando uma homenagem a esse povo que foi massacrado pelos colonizadores. São exímios caçadores e tem profundo conhecimento das ervas e seus princípios ativos, e muitas vezes, suas receitas produzem curas inesperadas. Usam em seus trabalhos ervas que são passadas para banhos de limpeza e chás para a parte física, ajudam na vida material com trabalhos de magia positiva, que limpam a nossa aura e proporcionam uma energia que irá nos auxiliar para que consigamos o objetivo que desejamos.

Os caboclos de Umbanda são entidades simples e através da sua simplicidade passam credibilidade e confiança a todos que os procuram. Nos seus trabalhos de magia costumam usar pembas, (giz de várias cores imantados na energia de cada Orixá), velas, geralmente de cera, essências, flores, ervas, frutas, charutos e incenso. Todo esse material será disposto em cima de uma mandala ou ponto riscado para que esse direcione o trabalho. Quando fazemos um trabalho para uma entidade da Umbanda e colocamos algum prato de comida, como, por exemplo, espigas de milho cozidas com mel, esta comida não é para o Caboclo comer. Como espíritos não precisam de comida, o alimento que está ali depositado serve como alimento espiritual, isto é, a energia que emana daquela comida é transmutada e utilizada para o trabalho de magia a favor do consulente da mesma forma que o charuto que a entidade está fumando é usado para a limpeza do consulente através da fumaça e das orações durante os chamados passes de Umbanda.

No culto de Umbanda, Oxóssi é o chefe da linha de caboclos.  O caboclo é a imagem do indígena nativo de nossa terra e quando incorporado, presta caridade, dá passes, canta, dança e anda de um lado para outro em lembranças aos tempos de aldeia. Conhecedores de muitas ervas, os caboclos têm um papel muito importante:  os remédios de ervas e amacis, em que amacis são mistura de ervas que maceradas servem para o fortalecimento do filho-de-santo.  Já os remédios de ervas são plantas ou ervas que combinadas ou sozinhas servem para aliviar ou até mesmo curar doenças.  Nisso tudo os caboclos têm participação muito especial e são encarados e interpretados pelo povo como uma entidade que veio ajudar e aliviar as pessoas dos seus problemas.

Alguns nomes de caboclos: Cabocla Jurema, Caboclo Pena Branca, Caboclo Tupinambá, Caboclo Sete Estrelas, Caboclo Ubirajara, Caboclo Guará, Caboclo Sete Flechas, Caboclo Ubiratan, Caboclo Pena Verde, Caboclo Pena Azul, Caboclo Urubatão, Caboclo Cobra Coral

 

CABOCLO BOIADEIRO

 

Dentre os muitos caboclos que baixam nos terreiros, o Caboclo Boiadeiro tem sempre uma participação especial nas seções de caboclo. Boiadeiro é muito respeitado e aplaudido por trazer de volta ao nosso convívio toda a sua experiência adquirida em tempos de boiada, do sertão bravio, do homem responsável pela conduta da boiada do seu patrão. Boiadeiro usa um chapéu de couro com abas largas (para proteger-lhe do sol forte), calças arregaçadas e movimenta-se muito rápido. Traz consigo um pequeno cântaro para carregar água, tão importante para a viagem, o chicote que usa para açoitar a res feroz e  a corda, usada para laçar o boi bravo ou para pegar aquele que se afasta da boiada, ou ainda usada para derrubar o boi para abate. Usam a guia para limpeza das pessoas.

 

BAIANOS

 

A corrente baiana é formada por espíritos alegres, brincalhões, descontraídos e adoram desmanchar demandas. São pessoas que viveram na Bahia (geralmente), e que vêm ao terreiro para passar seu axé e sua energia positiva. São muito conselheiros, orientadores, aguerridos e chegados à macumba (dança ritual), durante a qual trabalham enquanto giram com seus passos próprios. Apreciam as festas que lhes fazem, onde bebem batida de coco e comem comidas típicas da cozinha baiana. A gira do Povo Baiano é muito animada.

 

CRIANÇAS

 

São espíritos que já estiveram encarnados na terra e que optaram por continuar sua evolução espiritual através da prática de caridade, incorporando em médiuns nos terreiros de Umbanda. Em sua maioria, foram espíritos que desencarnaram com pouca idade (terrena), por isso trazem características de sua última encarnação, como o trejeito e a fala de criança, o gosto por brinquedos e doces.

Assim como todos os servidores dos Orixás, elas também têm funções bem específicas e a principal delas é a de mensageiro dos Orixás. Muitas entidades que atuam sob as vestes de um espírito infantil são muito amigas e têm mais poder do que imaginamos. Mas como não são levadas muito a sério, o seu poder de ação fica oculto. São conselheiros e curadores, por isso foram associados a Cosme e Damião, curadores que trabalhavam com a magia dos elementos. Não gostam de desmanchar demandas, nem de fazer desobsessões. Preferem as consultas e em seu decorrer vão trabalhando com seu elemento de ação sobre o consulente, modificando e equilibrando sua vibração, regenerando os pontos de entrada de energia do corpo humano. Esses seres, mesmo sendo puros, não são tolos, pois identificam muito rapidamente nossos erros e falhas humanas. E não se calam quando em consulta, pois nos alertam sobre eles. Eles manipulam as energias elementares e são portadores naturais de poderes só encontrados nos próprios Orixás que os regem. Quando incorporadas em um médium, gostam de brincar, correr e fazer brincadeiras (arte) como qualquer criança. É necessária muita concentração do médium (consciente), para não deixar que estas brincadeiras atrapalhem as mensagens a serem transmitidas. É comum em uma gira de criança ver um médium cambaleando antes de incorporar inteiramente. Isso ocorre devido à disputa que estes espíritos travam para ver quem incorpora primeiro, bem típico desta linha. O seu dia de comemoração (dia de Cosme e Damião) acaba virando uma grande festa de aniversário, pois adoram guaraná e doces e promovem uma animada bagunça quando baixam no terreiro. Sua energia é transbordante de vitalidade e alegria, sendo capazes de derramar as maiores bênçãos da  fertilidade e da harmonia.   Os meninos são em sua maioria mais bagunceiros, enquanto que as meninas são mais quietas e calminhas. Alguns deles incorporam pulando e gritando, outros descem chorando, outros estão sempre com fome. Estas características, que às vezes nos passam despercebidas, são sempre formas que eles têm de exercer uma função específica, como a de descarregar o médium, o terreiro ou alguém da assistência.  Estas entidades são a verdadeira expressão da alegria e da honestidade, dessa forma, apesar da aparência frágil, são verdadeiros magos e conseguem atingir o seu objetivo com uma força imensa, atuam em qualquer tipo de trabalho, mas são mais procurados para os casos de família e gravidez. Os pedidos feitos a uma criança incorporada normalmente são atendidos de maneira bastante rápida. Entretanto a cobrança que elas fazem dos presentes prometidos é grande. Nunca prometa um presente a uma criança e deixe de entregar assim que seu pedido for atendido, pois a brincadeira (cobrança) que ela fará para lhe lembrar do prometido pode não ser tão engraçada assim.

 

 

EXU E POMBA-GIRA

 

São espíritos que já encarnaram na terra. Na sua maioria, tiveram vida difícil como mulheres da vida, boêmios, dançarinas de cabaré. Estes espíritos optaram por prosseguir sua evolução espiritual através da prática da caridade, incorporando nos terreiros de Umbanda. São muito amigos quando tratados com respeito e carinho. São desconfiados, mas gostam de ser presenteados e sempre lembrados. Estes espíritos, assim como os Pretos-velhos, e crianças, são servidores dos Orixás.  Não se deve confundir os Exus da Umbanda com Exu da Nação (candomblé), pois são diferentes.  Apesar das imagens de Exus fazerem referência ao Diabo medieval (herança do sincretismo religioso), eles não devem ser associados à prática do Mal, pois como são servidores dos Orixás, todos têm funções específicas e seguem as ordens deles. Dentre várias, duas das principais funções dos Exus: a abertura dos caminhos e a proteção de terreiros e médiuns contra espíritos perturbadores durante a gira ou obrigações. Desta forma estes espíritos não trabalham somente durante a gira de Exus dando consultas, onde resolvem problemas de emprego, pessoal, ou de demanda de seus consulentes. Durante as outras giras (Caboclos, Pretos-velhos, Crianças e Orixás), protegem o terreiro e os médiuns para que a caridade possa ser praticada. Os exus recebem na Umbanda certas denominações como Povo de Rua, Compadres e Comadres ou Guardiões, para classificar entidades que trabalham num plano astral evolutivo. Estas entidades são firmadas em um lugar chamado de tronqueira.

Exu é um tipo de entidade que trabalha na esquerda, são os espíritos que melhor entendem o ser humano, pois conhecem nossos problemas. São entidades em evolução, seu trabalho é dirigido principalmente à defesa dos seus médiuns e à defesa do terreiro, porém, são muito procurados para resolver os problemas da vida sentimental e material. Costumam trabalhar com velas, charutos, cigarros, bebidas fortes, punhais em seus pontos riscados, pembas brancas, pretas e vermelhas. Devido ao seu temperamento forte e alegre costumam atrair bastante os consulentes, principalmente porque quando falam que vão ajudar certamente o farão.  Exu é a Polícia de Choque da Umbanda, é quem cobra na hora e também é quem tem maior ligação com os seres encarnados. Na falange de Exu existem muitos, e entre eles estão: Exu Tranca-Rua-das-Almas, Exu Tiriri, Exu Marabô, Exu Veludo, Exu Morcego, Exu Gira-mundo, Maria Padilha, Maria Mulambo, Exu Caveira , Exu Ventania etc. Existem três tipos de Exu:

 

EXU PAGÃO: é aquele que não sabe distinguir o Bem do Mal, trabalha para quem pagar mais. Não é confiável, pois se pego, é castigado pelas falanges do Bem, então volta-se contra quem o mandou.

 

EXU BATIZADO: é todo aquele que já conhece o Bem e o Mal, praticando os dois  conscientemente; são os capangueiros ou empregados das entidades, a cujo serviço evoluem na prática do bem, porém conservando suas forças de cobrança.

 

EXU COROADO: é aquele que, após grande evolução como empregado das Entidades do Bem, recebem, por mérito, a permissão de se apresentarem como elementos das linhas positivas como Caboclos, Pretos Velhos, Crianças, Oguns, Xangôs e até como Senhoras.


Os Exus estão divididos em 3 grandes linhas: Cemitério, Encruzilhada e Estrada.

 

Exus do Cemitério: É formada por Exus sérios, em sua maioria servidores de Omulu (Rei do Cemitério). Não costumam dar consulta, se apresentam principalmente em grandes obrigações, trabalhos e descarregos.   Ex: Exu João Caveira; D. Maria Quitéria; Exu Caveira, D. Rosa Caveira; Exu  7 Catacumbas; Exu 7 Facas, etc... 

 

Exus da Encruzilhada: Esta linha é formada por Exus que servem a Orixás diversos. Não são brincalhões como os Exus da estrada, mas também não são tão fechados como os do cemitério. Gostam de dar consultas e também de participar em obrigações e descarregos. Alguns deles se aproximam muito, em suas características, da linha do cemitério e são os que chamamos de Encruza pesada, enquanto outros se aproximam mais da linha da estrada, a Encruza leve. Ex: Exú Tranca Rua; Exú. Veludo; Exú das 7 Encruzilhadas; D. Maria Mulambo; etc...

 

Exus da Estrada: São os mais brincalhões. São os guias que mais dão consultas em uma gira de Exu, se movimentam muito e também falam bastante. Alguns chegam a dar consulta a várias pessoas ao mesmo tempo.  Nesta linha trabalham vários espíritos, desde os Exus da estrada propriamente dita, como também os Ciganos e a malandragem. Também se encaixam nesta linha alguns espíritos que, apesar de já terem atingido um certo grau de evolução, optaram por continuar sua jornada espiritual trabalhando como Exus mesmo. Ex: Exu Mangueira, Exu do Tempo, D. Maria Padilha, Sr. Zé Pelintra, D. Rosa Vermelha, Sr. Tiriri, D. Cigana/Ciganinha. Não é incomum encontrar terreiros que giram  ciganos junto com os Exús.

Sua cor é Vermelha e preta.  Sua guia também é vermelha e preta, ou amarela e preta ou preta e branca, assim como sua roupa. As Pombas-gira usam as saias compridas e blusa, e os Exús, calça, camisa e capa.

Erva: folha da fortuna 

Simbolo: é o tridente

Número:  7  

Dia: segunda-feira 

Elemento e força da natureza: fogo

Chakra atuante: básico ou sacro

Saudação:Laroiê-Exu
Negativo: Quiumbas (
são os espíritos do mal, que tentam incorporar em médiuns não evangelizados e disciplinados para fazer maldades e denegrir a umbanda).

Local de entregas: Encruzilhadas, cemitérios, praias, lodo, pedreiras, etc.

 

Encruzilhadas para os Exus:

Encruzilhadas abertas: para todos Exus (indistintamente)

Encruzilhadas fechadas: para todos os Exus (indistintamente)

Porteira de Curral: Exu das Sete Porteiras

Encruzilhadas Mistas: Exus mirins, etc...

Encruzilhadas em "S" ou curvas: Exu Tira-teima

Encruzilhadas em pé de galinha: Dona Pomba-gira

Encruzilhadas em forma de T: Dona Pomba Gira

Encruzilhadas de estrada de ferro: Dona Maria Padilha

Encruzilhadas de caminho do mato: Dona Maria Molambo

Nas curvas em S nunca se caminha pelo lado do ângulo da curva.

Nunca se deve atravessar as encruzilhadas em diagonal, principalmente as de dentro do cemitério. Ao utilizar-se uma porteira de curral, entra-se pelo lado direito e sai-se pelo esquerdo.

 

Os Exus nas sete linhas de Umbanda

 

Linha de Oxalá: Exu Tiriri, Exu Veludinho, Exu Gira Mundo, Exu Sete Encruzilhadas etc.
Linha de Yemanjá: Todas as Pombas-gira.

Linha de Ogum: Exu Tranca Ruas das Almas, Exu tranca Ruas de Embaré, Exu Tranca Ruas das 7 Encruzilhadas, Exu Veludo, Exu 7 Encruzilhadas, Exu 7 Facas, Exu da Mangueira

Linha de Oxóssi: Exu Marabô, Exu Tronqueira, Exu Mangueira e outros.
Linha de Xangô: Exu Marabô, Exu Toquinho, Exu Labareda, Exu do Lodo, Exu Pedra Negra.
Linha de Yorimá: Exu Caveira, Exu Tatá Caveira, Exu 7 covas, Exu Bananeira, Exu Mulambo, Exu 7 porteira e outros. 
Linha de Yori: Todos os Exus mirins.

 

A Umbanda é uma religião que, como diz Pierre Sanchis[18], tem seus fios intimamente trançados com a experiência do catolicismo no universo popular da religião. Este autor diz que é impossível pensar o mundo afro no Brasil como puramente africano. “Ele vive, recria-se constantemente, dinâmica e conflitualmente segundo uma linha de representação identitária que, algumas vezes o joga no caminho da assimilação de outras influências, latentes ou ativamente presentes no espaço religioso do Brasil”.[19]  

Influência do cristianimo? Sim, mas nem tão sozinho, nem, talvez, de modo tão direto. Porque é preciso introduzir outro filão religioso, outro universo simbólico que, infiltrado mais tarde no Brasil, veio reativar latências antigas, articular-se a elas e marcar tão profundamente o campo que alguns analistas se perguntam se a “cultura religiosa brasileira fundamental”, mais ainda do que católica, não deveria ser considerada como cunhada por ele: o espiritismo.(...) Quarta filão, e quarta família, de introdução mais recente, mas já “brasileiramente” assimilada em certas correntes umbandistas, a dos cultos de origem oriental. Budismo nas suas várias obediências, hinduísmo de Krishna, grupos japoneses do Seicho no Iê, da Perfect Liberty, ou da Igreja Messiânica, etc.[20]

            Desta forma, Sanchis resume a umbanda, “nem África pura, nem catolicismo europeu”. Uma religião que dialoga com Orixás, mortos, santos ou entidades, “Nossas Senhoras que aparecem e vêm conviver com os homens, anjos, espíritos, forças cósmicas, demônios – ou tudo isso ao mesmo tempo”[21]. Umbanda, religião brasileira.



[1] ROHDE, Bruno Faria. Umbanda, uma religião que não nasceu. Texto apresentado no V ENECULT em 27 a 29 de maio de 2009. Salvador.

[2] GIUBELLI, Emerson. Zélio de Moraes e as origens da umbanda no Rio de Janeiro. In: SILVA, Vagner Gonçalves da (Org.). Caminhos da alma: memória afro-brasileira. São Paulo: Summus, 2002.

[3] GIUMBELLI, Emerson. Zélio de Moraes e as origens da umbanda no Rio de Janeiro. In: SILVA, Vagner Gonçalves da (Org.). Caminhos da alma: memória afro-brasileira. São Paulo: Summus, 2002, p. 185.

[4] Idem.

[5] OLIVEIRA, J. Alves. Umbanda cristã e brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, s/d, 1985.

 

[6] PRANDI, Reginaldo. De africano a afro-brasileiro: etnia, identidade, religião. São Paulo: Revista USP, n. 46, p. junho/agosto 2000.

[7] BROWN, Diana. O papel histórico da classe média na umbanda. Texto referente a trabalho apresentado no 10º Encontro da Associação Brasileira de Antropologia, Salvador, Bahia, fevereiro de 1976.

[8] CAVALCANTI, Maria L.V. O que é o espiritismo. São Paulo: Editora Brasiliente S/A, 1985.

[9] BROWN, Diana. O papel histórico da classe média na umbanda. Texto referente a trabalho apresentado no 10º Encontro da Associação Brasileira de Antropologia, Salvador, Bahia, fevereiro de 1976.

[10] OLIVEIRA, J. Alves. Umbanda cristã e brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, s/d, 1985.

[11] ROHDE, Bruno Faria. Umbanda, uma religião que não nasceu. Texto apresentado no V ENECULT em 27 a 29 de maio de 2009. Salvador.

[12] BROWN, Diana. Uma história da Umbanda no Rio. P. 9-41.

[13] CONCONE, Maria Helena & NEGRÃO, Lísias. Umbanda: da repressão à cooptação - o envolvimento político-partidário  da umbanda paulista nas eleições de 1982. In: BROWN, Diana et al. Umbanda e política. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1985. (Cadernos do ISER, 18)

[14] ROHDE, Bruno Faria. Umbanda, uma religião que não nasceu. Texto apresentado no V ENECULT em 27 a 29 de maio de 2009. Salvador.

[15] Idem.

[16] Id.

 

[17] GIUMBELLI, Emerson. Zélio de Moraes e as origens da umbanda no Rio de Janeiro. In: SILVA, Vagner Gonçalves da (Org.). Caminhos da alma: memória afro-brasileira. São Paulo: Summus, 2002, p. 211.

 

[18] SANCHIS, Pierre. As Religiões dos Brasileiros. Belo Horizonte: Revista Horizonte, v.1, n.2, p. 28-43, 2º sem. 1997.

[19] SANCHIS, Pierre. As Religiões dos Brasileiros. Belo Horizonte: Revista Horizonte, v.1, n.2, p. 28-43, 2º sem. 1997, p. 31.

[20] Idem, p. 32.

[21] Idem.

Última atualização em Seg, 29 de Abril de 2019 16:35